Liliana Tinoco Bäckert – Treinadora intercultural na Suíça

Liliana Tinoco Bäckert veio do Rio de Janeiro para Baden, Suíça, há 12 anos. Com mestrado em Comunicação Intercultural pela Universidade da Suíça Italiana, ela transformou sua difícil integração no país em missão de vida: promover a sensibilidade intercultural da comunidade brasileira que vive no mundo e, dessa maneira, ajudar no processo de adaptação. Empreendedora, Liliana criou a empresa de Consultoria Adapte-se e oferece treinamentos e workshops sobre questões relacionadas a diferenças culturais e adaptação para brasileiros e estrangeiros, além de cursos para casais binacionais, que precisem entender melhor a cultura do outro. Ela também pretende desenvolver trabalho voluntário com a comunidade brasileira na Suíça, oferecendo gratuitamente palestras motivacionais e informativas sobre como viver no exterior.

A sensibilidade intercultural é uma habilidade que pode ser aprendida e treinada. O objetivo é permitir que pessoas consigam conviver mais facilmente com o diferente. E isso quer dizer mudança de mentalidade em relação à diversidade em geral: aceitar a opinião, os hábitos e a aparência de um grupo específico de pessoas que não seja como você, tão importante quando se vive fora do país de origem. Trocando em miúdos, aumentar a sensibilidade intercultural seria preparar o indivíduo para um mundo muito maior que a sua cidade, seu bairro ou casa. Isso envolve praticamente tudo, porque a cultura é ampla e acompanha o ser humano em suas atividades mais básicas, que vão desde a sua alimentação, passando pelo horário da refeição, noções de higiene, idioma, música e até na forma como se demonstra amor, causa inclusive de tantos problemas de relacionamentos com casais com duas nacionalidades.

A jornalista escreve, desde novembro, uma coluna sobre adaptação e integração da comunidade de língua portuguesa na Swissinfo.ch. Denominada Suíça de Portas Abertas, a coluna tem o objetivo de trazer informações sobre o tema, sempre com uma mensagem esclarecedora e positiva, reforçando a ideia de que o estrangeiro pode criar suas próprias oportunidades, abrindo literalmente portas ainda fechadas.

Como surgiu a ideia de residir no exterior?
Aconteceu. Quando meu marido, na época namorado, me perguntou se eu teria problema em morar na Suíça com ele, eu obviamente disse que não. Eu não iria deixar de acompanhá-lo por medo do desconhecido. Eram meados de 2004, eu tinha 31 anos e já estávamos juntos há dois anos. Alemão, ele trabalhava como expatriado no Rio quando nos conhecemos. O que me surpreende hoje foi a inocência com a qual me joguei na empreitada e o sonho utópico que me acompanharam na época, típico da juventude. Eu achava que a vida seria muito mais fácil na Suíça e que todas as dificuldades de se viver longe da família poderiam ser compensadas pelo fato de se estar em um país de primeiro mundo. Para mim, os maiores problemas que eu enfrentaria seriam a língua, o inverno rigoroso e a distância. Eu não estou falando de arrependimento, mas simplesmente de falta de preparo para a talvez maior das empreitadas da minha vida.

Como surgiu a ideia de trazer conforto aos brasileiros por meio de treinamento intercultural?
Eu vivi um grande choque cultural quando emigrei para a Suíça. Sofri muito com a adaptação por desinformação e, no auge da minha angústia, decidi que eu deveria estudar e entender o que estava acontecendo comigo. Foi quando eu fiz um curso de especialização em comunicação intercultural em Lucerna e comecei a compreender que as pessoas simplesmente eram diferentes e reagiam de outra forma aos mesmos estímulos. A cara fechada do suíço não era má vontade ou uma questão pessoal contra mim, mas simplesmente maneiras variadas de ver uma determinada situação. Por exemplo: muitos maridos suíços não concordam em fazer uma festa de aniversário nos moldes brasileiros para o filho, motivo de briga para muitos casais binacionais. É importante entender que celebrações como aniversário são ritos de passagem, interpretados e celebrados de jeitos diferentes em cada cultura. Dessa maneira, a melhor estratégia é explicar as razões e entrar em acordo sobre qual aspecto cultural pode ser reforçado naquela situação. Aprendi que emigrar é se reinventar e o desafio está justamente nisso.
Eu gostei tanto de entender o processo de imigração que decidi fazer o mestrado. A minha tese de conclusão do curso focou nas barreiras culturais enfrentadas por brasileiras na Suíça alemã e me fez entender que a falta de informação sobre essas diferenças é uma das maiores causas de sofrimento e maus entendidos. Assim como eu não sabia, os brasileiros não imaginam o real significado de ir embora do seu país e viver em uma sociedade culturalmente tão distinta. Por isso o meu interesse e foco em desenvolver treinamento intercultural. Eu considero essa competência essencial para o mundo que se apresenta para nós hoje.

E o que você diria aos brasileiros que estejam prestes a deixar o Brasil ou aos que já tenham ido embora?
Eu diria que o sucesso da imigração passa muito pela disposição em se informar, aprender e a ser flexível. Eu falo pelo que aconteceu comigo e pelo resultado dos meus estudos: a maioria dos estrangeiros não sabe o que realmente significa deixar o país e se perde ao ter que recomeçar um novo capítulo da vida, longe de tudo que se conhece, sem trabalho, amigos ou conhecidos. Vêm com uma idealização, com um sonho e se deparam com uma realidade dura, mas obviamente com outras enormes oportunidades.
Morar fora do país significa reaprender tudo, desde a distância física a ser tomada entre o locutor e o interlocutor, passando por novas regras de polidez, escutar o outro com menos julgamento, a comer de forma diferente e, principalmente, a se conhecer melhor para dar conta disso tudo. É um exercício de diário de observação, de paciência, de comparação com o que se aprende em casa e como deve-se comportar com esse novo grupo de pessoas. São nuances, um caminhar inseguro por regras não escritas e implícitas, mas que só a perspicácia e a vontade de aprender podem te ajudar. Embora extremamente desafiador, é intrigante e, com o tempo, muito recompensador. O conselho que eu dou, então, é para que tenha empatia com o outro e se informe o máximo possível, antes de vir e durante jornada, tente sempre entender o porquê daquela determinada sociedade agir dessa maneira e não de outra. Isso evita problemas e maus entendidos. E o mais importante, quem abre as portas das oportunidades é você, seja no Brasil ou no exterior. Então, escreva o roteiro da sua vida e mãos à obra.

Adapte-se Intercultural Competence Training
www.adaptese.com
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Sobre Marisa Pedro Pfeiffer

Marisa Pedro Pfeiffer é natural de São Bernardo do Campo e mora com a família na Suíça desde 2008. Ela é fotógrafa e editora da Brasileiros Mundo Afora.

Uma resposta para Liliana Tinoco Bäckert – Treinadora intercultural na Suíça

  1. Ana Lucia Menezes diz:

    Conheço essa menina desde criança, e eh maravilhoso ver como a realidade do que imaginamos quando criança toma forma. Uma garota doce, irrequieta, inteligente e que não se contentava com o óbvio, eh essa mulher, mãe e profissional que hj desbrava novas culturas!!! Tudo a ver com o espírito que alimentávamos em nossa doce infância!!!!